PROTEÇÃO
MATERNA
Luciane e Clelia fazem parte do grupo de mulheres que enfrentam, diariamente, mais de um turno em suas rotinas, e fazem isso de uma forma muito especial Ambas trabalham como guardas municipais - a primeira há 16 anos e a segunda há sete - e escolheram o período noturno para exercer a profissão.
É no finzinho da tarde, quando a maioria das pessoas estão voltando para o aconchego de suas famílias, ao som das buzinas motivadas pelo trânsito caótico de São Paulo e dos trilhos que cortam a cidade, que as duas mulheres se preparam para começar mais uma jornada de trabalho. E em meio a tantas incertezas, numa profissão que normalmente não atrai o público feminino, é preciso sair de casa preparada para lidar com o pior do ser humano.
Luciane tem 50 anos e é a caçula da família, enquanto Clelia, de 43 anos, tem dois irmãos mais novos. Além da profissão em comum, da determinação no trabalho, e do fato de serem as únicas filhas na família, há outro aspecto que chama a atenção na história das duas: a maternidade.
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Mesmo sabendo que os filhos estão sendo muito bem cuidados pela avó, deixá-los em casa para trabalhar é algo que mexe demais com o sentimento de Luciane. Quando vai atender uma ocorrência na madrugada, uma única frase vem sempre à sua mente: “por favor, que não tenha criança”. Em alguns dias, a vontade é de largar tudo só para ter a oportunidade de passar a noite com eles, mas a profissional sabe que não pode fazer isso. Então é preciso seguir com o trabalho, até que o turno acabe e a guarda municipal possa enfim reencontrá-los no dia seguinte.
Quando está em casa, é ao filho Isaac de 11 anos, diagnosticado com autismo, que mais dedica cuidados. O menino acompanha a mãe em todas as tarefas dentro de casa e até uma ida ao banheiro desperta a atenção do garoto, que vive na ânsia de passar o maior tempo possível com Luciane.
O apego não termina nem na hora de dormir. Mesmo com a bicama comprada especialmente para ficar mais perto um do outro, ela acaba dividindo o espaço em sua própria cama com Isaac.
Clelia também precisa enfrentar desafios. Com 14 anos de casada, passou a prestar diferentes concursos em busca da tão sonhada independência financeira, e também pelo receio de que, de uma hora pra outra, as coisas pudessem mudar em sua vida. Manteve o casamento até as filhas completarem idades para compreenderem toda a situação e para que a mais velha, Isabele com 16 anos na época, cuidasse da mais nova, Larissa, que tinha apenas 12 anos, enquanto ela estivesse no trabalho.
E mesmo com as preocupações dos familiares em relação à nova profissão, Clelia não deixou de seguir o seu caminho, motivada por um único objetivo: não deixar as filhas desamparadas. Em contrapartida, a mulher que trocou o dia pela noite recebe o amor incondicional e a admiração das duas.
Além disso, a grande felicidade de Clelia, enquanto está fardada, em pleno exercício da profissão, é encontrar crianças que, assim como as filhas, a admiram e correm em sua direção para dar um abraço. É esse envolvimento que tem marcado a carreira dessa guarda municipal.
Mulheres, profissionais, em atividades de risco, atuando num período fora do convencional e mães. Luciane e Clelia seguem a vida movidas por um sentimento maior, forte e intenso, capaz de transformar o modo de encarar as situações que enfrentam durante o trabalho e fora dele. De certa forma, quando estão trabalhando, a proteção materna se expande dos filhos para a sociedade.
